O Dilema do Ar Condicionado

Os efeitos da Guerra num contexto de países desenvolvidos

ARTIGOECONOMIA

Carlos Eduardo Costa

5/30/20222 min read

Sei que pode parecer esquisito, mas, se pensarmos bem, as nossas histórias mais corriqueiras do dia-a-dia podem, muitas vezes, ligar-se a questões políticas; então fiz esse mesmo exercício. Tenho um amigo meu – que, se ler isto, vai ter vontade de cometer algum crime contra mim – que constantemente se queixa do seu carro, que já tem alguma idade, e refere de forma veemente que a única coisa que pretende num carro novo é que ele tenha ar condicionado. Confusos? Já irão entender...

Acho que ninguém tem dúvidas que o ar condicionado, quer no verão, quer no inverno, é algo extremamente agradável. Agora, façam o seguinte exercício: coloquem o ar condicionado num lado da balança e, do outro, a paz; a resposta sobre para que lado deve pender mais não é nada difícil, certo? Na teoria, sem dúvida; na prática, nem tanto...

Foi com esta metáfora que Mario Draghi, primeiro-ministro italiano, veio abordar a forma como a Europa, em geral e, em particular, a União Europeia se deve posicionar em relação à Rússia e às atrocidades que está a cometer em território ucraniano.

A Rússia é a principal fornecedora de gás natural da Europa – em particular da Europa Central –, mas, tendo em conta o que se tem sucedido nos últimos dois meses, o cordão sanitário ao país comandado por Vladimir Putin é necessário. Contudo, há uma série de questões que se colocam, e que, muitas vezes, têm mais que ver com os próprios países europeus do que com o país ocupado ou com o ocupante.

Voltando ao ar condicionado, se é certo que, para a maioria dos portugueses, tendo em conta questões socioeconómicas, não faria qualquer diferença desligarmos o ar condicionado por uns tempos para garantir a paz – termo para não ferir suscetibilidades ligadas ao partido comunista –, se formos para países como a Alemanha, a França ou até a própria Itália, países que são, de uma forma geral, mais ricos que nós e dos mais ricos no contexto da UE, se calhar as populações já ponderariam se, de facto, não era “chato” ter que desligar o ar condicionado. E assim encontramos um entrave muito claro para que esta situação cesse.

A necessidade do chamado “cordão sanitário” nunca foi mais necessária do que neste momento, em que já chegamos ao ponto em que Putin provoca entidades como as Nações Unidas – que, verdade seja dita, tem sido um desastre na resolução desta guerra – ao atacar Kyiv no mesmo dia em que António Guterres se reúne com Zelensky. E a suspensão das importações do gás russo é a maior derrota que Putin e o seu regime iria ter, sendo, possivelmente, a forma de assinalar o início do fim deste drama que o povo ucraniano sofre há mais de dois meses. Problema? As empresas europeias – nomeadamente as alemãs – já começaram a abrir contas para pagar o gás em rublos. Assim claramente não fica fácil para ninguém.

Bem sei que acertar no “Euromilhões” ao sábado é muito mais fácil, mas talvez se potências europeias como a Alemanha não tenham colocado a faca e o queijo na mão da Rússia, hoje não estaríamos com estas dificuldades.

Agora, aquilo que, neste momento, eu peço é que se tenha um pouco mais de decência e que as diversas potências europeias tenham um papel importante no desfecho deste triste episódio, pois, pelo andar da carruagem, irão acabar afixados na parede da vergonha, onde já está, por exemplo, o PCP.

Este artigo representa exclusivamente a visão pessoal do seu autor.