Porque Falham ou Prosperam as Nações: O papel da Igualdade de Género
ARTIGOPOLÍTICA
No passado dia 14 de outubro, o Prémio Nobel da Economia foi atribuído a Daron Acemoglu, Simon Johnson e James A. Robinson, autores de “Porque Falham as Nações”. Os estudos destes autores apresentam a relação entre a organização socioeconómica e a prosperidade, revelando como a qualidade das instituições influencia a criação de riqueza.
Neste sentido, os autores procuram explicar por que razão países mais democráticos, pluralistas e com estruturas legais que garantem igualdade de oportunidades, conseguem alcançar um desenvolvimento mais rápido, profundo e com maior igualdade entre os cidadãos. Ao longo do prestigiado livro são feitas várias comparações entre países com instituições inclusivas, que promovem o crescimento e a inovação, e instituições extrativas, que limitam o desenvolvimento e mantêm os países presos a ciclos de pobreza e desigualdade.
O desenvolvimento económico dos países tem sido alvo de estudo ao longo dos últimos séculos, tendo contribuições, inclusive de Adam Smith na “Riqueza das Nações”, cuja abordagem é centrada nos mecanismos do mercado livre e no comportamento económico individual. No caso, o mérito dos galardoados reside na adição da dimensão das instituições, passando a ser vista como um fator determinante para a equidade, estabilidade e prosperidade das nações.
Esta distinção, há muito aguardada por vários economistas, inaugura uma nova abordagem da economia, redefinindo a compreensão do desenvolvimento económico. Assim sendo, também é reforçado o papel das desigualdades como barreiras a superar para alcançar o crescimento económico sustentado. Isto porque a adoção de instituições inclusivas, que promovam a participação e garantem oportunidades para a maioria da população, geram crescimento económico sustentável e reduzem desigualdades. No caso da desigualdade de género, um estudo do FMI Research sugere que a redução da disparidade entre homens e mulheres nos mercados de trabalho pode aumentar em cerca de 8 % o PIB nos mercados emergentes e nos países em desenvolvimento, o que sublinha esta correlação.
É amplamente reconhecido que os países europeus, de forma geral, têm avançado de forma significativa em direção à igualdade de género. No entanto, ainda não se encontram numa situação verdadeiramente igualitária em todas as dimensões da sociedade. Como podemos constatar, por exemplo, pela pequena representação feminina no prémio Nobel da Economia, em que entre os noventa e seis distinguidos apenas três são mulheres.
Infelizmente, e apesar de estudos como o da BCG indicarem que empresas com maior diversidade de género nas lideranças geram mais receita a partir da inovação, os dados mostram uma realidade desanimadora. Em 2020, o BM constatou que a taxa de participação feminina na força de trabalho global era de 47%, enquanto a masculina era de 74%. Além disso, segundo a OIT as mulheres ganham, em média, 20% menos que os homens, ao exercer as mesmas funções, e, segundo a ONU dedicam 2,5 vezes mais tempo ao trabalho doméstico não remunerado. Estes números refletem desigualdades persistentes, urgindo uma transformação institucional profunda. Portugal ocupa o 15° lugar no ranking do Gender Equity Index 2022 do EIGE, e apesar deste facto representar uma contínua melhoria, nomeadamente no âmbito laboral, o país ainda se encontra abaixo da média europeia, muito devido ao trabalho doméstico.
Neste sentido, reduzir estas disparidades deve ser um objetivo contínuo e atual da sociedade portuguesa. Este poderá ser alcançado através da adoção de políticas como a implementação de um sistema em que as empresas são incentivadas a provar que pagam o mesmo salário a homens e mulheres, assim como através de quotas de género em órgãos de decisão e licenças parentais generosas e partilhadas. As medidas referidas são aplicadas na Islândia que, de acordo com o Relatório Global de Desigualdade de Género 2023 do FEM, é o país mais igualitário na questão de género. É importante referir que é profundamente lamentável a necessidade de implementar quotas para garantir uma participação igualitária, o que reforça a ideia de que a desigualdade de género é um valor intrínseco da nossa sociedade.
Tendo em conta o novo paradigma, o Governo não é o único responsável por implementar medidas no sentido de reduzir a desigualdade de género, visto que as instituições englobam também as normas sociais, comportamentos e mentalidades que moldam a nossa sociedade. Desta forma, é essencial questionar e transformar mentalidades, abandonando, por exemplo, o receio de que as mulheres ocupem cargos de poder tradicionalmente dominados por homens. Até porque a discriminação, no ambiente de trabalho, já gerou problemas adicionais que não têm recebido a devida atenção, como apontam os estudos que indicam que a desigualdade de género no mercado de trabalho é uma das principais causas dos atuais desafios demográficos.
É urgente corrigir essa situação e estarmos dispostos a aceitar a igualdade em detrimento da superioridade, não apenas no contexto da desigualdade de género, mas reconhecendo que vivemos num mundo plural e que podemos e devemos tirar partido disso. Agora que a questão da desigualdade, profundamente enraizada na nossa sociedade, pode ser reconhecida como um problema económico, espero que receba a atenção necessária para que seja possível mitigá-la. Não deixará de ser lamentável ser necessário provar que a desigualdade compromete o crescimento, de modo a ser possível adotar abordagens mais inclusivas e passíveis de resolver este problema. Se, de facto, esta mudança acontecer, os benefícios gerados serão profundos e duradouros, refletindo-se no bem-estar social e na prosperidade económica do país.
Porém, isto depende de todos, em retrospetiva, quantas vezes discriminamos pessoas com base no seu género, etnia, orientação sexual ou qualquer outra característica? Discriminar não é apenas o ato explícito de rejeição ou violência, mas também se manifesta na falta de oportunidades e no tratamento desigual.