Perspetivas de Governabilidade: Incertezas e Desafios para Portugal
No rescaldo destas Legislativas, a CPS junta-se ao CIC para oferecer uma visão daquilo que poderão ser os próximos tempos.
ARTIGOPOLÍTICA
No passado dia 10 de março, Portugal foi chamado a eleger a nova composição da Assembleia da República para os próximos 4 anos. Muito se especulava sobre os resultados eleitorais do dia 10 de março, de tal forma que foi preciso esperar que fossem apurados resultados da emigração para se indigitar o Primeiro-Ministro. Em primeiro lugar, vemos uma vitória da AD, que conseguiu assegurar 78 lugares para os deputados do PSD e 2 para a volta do CDS ao parlamento português. A surpresa surge ainda a seguir, ao verificar que o PS, apesar de tudo, ainda conquistou 78 mandatos, menos 42 do que na legislatura passada.
A subjetividade dos objetivos de cada partido, torna a análise critica dos resultados eleitorais complexa, contudo alguns resultados são bastante transparentes.
O eleitorado esquerdista português voltou a reorganizar-se pelos diversos partidos desse espectro. O Partido Socialista foi o que se viu mais afetado, pois, se outrora apelou a maioria absoluta em nome da “estabilidade”, a falta desta foi o principal motivo de enfraquecimento político do Governo. Alguns eleitores de centro não se vendo representados por António Lacerda Sales, Miguel Alves, Augusto Santos Silva, João Galamba e, o atual Secretário-Geral, Pedro Nuno Santos, também optaram por uma mudança nessas eleições. O resultado obriga o partido a uma certa limpeza de imagem e uma obrigatoriedade de liderar a oposição
A AD ganhou as eleições, mas os números não são de exaltar. A união PSD/CDS/PPM angariou um aumento de menos de 10% no número votos em comparação à eleição anterior, em eleições nas quais era obrigatório ganhar. Concluímos, portanto, que, para além alguns eleitores de centro, não conseguiu nem comover novos eleitores, nem demover eleitores tradicionalmente de direita. Em nome de uma governação para mais de 6 meses, os sociais-democratas devem optar pela direita radical ou esquerda moderada um consenso que não é encontrado sequer na mais alta cúpula do PSD.
O real vencedor da noite, Chega, com sua capacidade de trazer para as urnas eleitores adormecidos, jovens, e roubar eleitorado, principalmente ao PS e PCP. Mais que quadruplicaram o seu número deputados, romperam o bipartidarismo, pela segunda vez em Portugal e fizeram-se ouvir a todos que deslegitimavam sua presença na Assembleia na República. O voto impulsivo teve força, juntamente com o crescimento internacional da direita radical e da extrema-direita. As estratégias, tanto nas atitudes do líder, quanto na campanha de rede social, puseram na mão de um partido, cuja história demonstra um senso de responsabilidade questionável, um poder notório.
Na reorganização dos votos à esquerda, o Bloco de Esquerda não conseguiu trazer de volta os seus eleitores que divergiram para o PS na última legislatura, talvez por ser um eleitorado mais sério em busca de uma esquerda menos populista e mais intelectual. Esta parcela da população foi eficazmente atraída para o livre, que mostrou potencial nas ideias, algo que o ajudará estrategicamente também.
A Iniciativa Liberal também não saiu vitoriosa da noite eleitoral, com uma ligeira subida no número de votos. Perdeu força na capital do país. Apesar de se apresentaram como um projeto que leva tempo a construir-se, solidificar-se e desconstruir algumas “verdades absolutas” difundidas pelo poder mediático do centro.
Portanto concluímos que, após uma abrupta queda do Governo de António Costa a estratégia do PS tanto de propaganda, quanto a de aumento de população com rendimentos diretamente dependes do Estado, serviram de “air-bag” para os resultados eleitorais, indubitavelmente uma derrota controlada. A falta de uma estratégia do PSD nos últimos anos leva-os a esse ponto, colar-se ao PS e perder todo seu eleitorado de direita ou colar-se ao CH e perder todo seu eleitorado moderado.
O CH por sua vez tem a obrigação de sustentar a inimaginável quantidade de causas que se comprometeu a defender, com risco de com a mesma velocidade que cresceu, desaparecer da AR.
O Livre, BE e PCP estão num impasse, enquanto querem angariar eleitores do PS, vêm-se obrigados a fazê-lo de uma forma muito mais delicada a fim de não incentivar uma ascensão ainda maior da direita radical. Os liberais estão diante de novas possibilidades estratégicas, numa situação relativamente confortável, visto que ganham com qualquer deslize dos outros partidos da direita, enquanto têm capacidade e tranquilidade para ganhar eleitores também nos jovens, e intelectuais de direita.
Passemos, agora, a uma análise dos resultados sob uma perspetiva mais pragmática, e que se revela essencial em toda e qualquer eleição: as perspetivas de estabilidade governativa.
A vitória tangencial da Aliança Democrática confere-lhe, desde logo, legitimidade constitucional para formar Governo, implementando as medidas apresentadas no decorrer da campanha eleitoral, e que reuniram as preferências dos portugueses nas urnas. Ainda assim, a escassa diferença em número de mandatos face ao Partido Socialista deixa antever uma legislatura turbulenta para os sociais-democratas, ainda para mais com a ascensão do Chega, que reúne uma bancada parlamentar de 50 deputados.
Em termos meramente aritméticos, facilmente chegamos à conclusão de que uma aliança entre a AD e o Chega resultaria numa clara maioria à direita no Parlamento; ora, esta tem sido a retórica de André Ventura, que aposta as fichas todas em tentativas desesperadas de seduzir Luís Montenegro, fazendo com que o líder laranja volte atrás no “não é não “que repetiu inúmeras vezes ao longo dos últimos meses. Os esforços de Ventura parecem não surtir efeito, mantendo-se Montenegro firme e fiel à sua palavra.
Assim sendo, abre-se um horizonte solitário para a AD, que terá de governar sozinha num cenário adverso de oposição que chega, naturalmente, dos partidos à esquerda, mas também da direita, onde André Ventura procurará, certamente, capitalizar o resultado eleitoral que alcançou, assumindo-se como líder da oposição.
Em conclusão, os resultados carregam consigo o peso de uma legislatura instável e de contornos imprevisíveis, quer na sustentabilidade do Governo, quer na própria duração da mesma. A quebra no bipartidarismo, que se verificava há várias décadas em Portugal, coloca em causa a orientação política do país, trazendo todo um conjunto de novos desafios à classe política e governativa. Deste modo, prevê-se que a estabilidade do país é uma característica a se recuperar não de imediato, mas sim a longo prazo. Cabe a todos nós mantermo-nos atentos ao desenrolar do futuro, sempre com um olhar crítico sobre as decisões que afetam o nosso dia a dia e o nosso futuro, escrutinando a atividade política com o objetivo último de salvaguardar os interesses de Portugal e dos portugueses.